sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Eu´s

Estava eu a andar pela rua, nua, crua
A luz não havia! O vento já cessara!  As estrelas do céu já recolhidas
De repente vi! Não os teus olhos, mas a luz que deles saia
Mirei-os. Segui-os. A fim de encontrar o que nem soubera ter perdido
Tal qual faróis a guiar o pescador solitário no mar alto e inquieto
Segui-os. Mirei-os
Não calcei os pés. Não protegi o corpo tão reprimido e indefeso
Apenas me pus a andar e andar e and...ar
Te perdi! Num momento de distração não estavas mais ali
Breu total. Negrume infeliz.
Esbarrei numa pedra e ali encostei-me e adormeci
Acordei e me deparei comigo mesma... Encolhida... Embranquecida... Inerte... Imóvel...
Sai de mim mesma e pude ver-me ali, caída. Estranha sensação de vazio e ao mesmo tempo de refazimento. Meus dois Eu´s agora um diante do outro como nunca fora, como nunca pudera
Peguei meu outro eu desfalecido no colo, esquentei-lhes as mãos, soprei-lhe de leve seu rosto a fim de que o calor de meu hálito pudesse esquentar o rosto tão fragilmente embranquecido
Olhei para aquele outro eu e admirei a criação perfeita num ser tão imperfeito e fiz renovar-se o amor que tivera perdido
Amei-me. Amei aquele ser tão frágil ali adormecido. Amei cada ferida já cicatrizada e acariciei as mais recentes e ainda abertas. Amei cada marca do tempo tatuada em seu rosto, amei
Amei os calos de suas mãos donde não se via nenhum sinal de realeza, mas de súdita, ou talvez de escrava. Amei e continuei amando... Mesmo que, jamais venhamos a nos olhar simultaneamente. Mesmo assim, eu, ainda estarei ali. E ainda que eu não esteja, ela – meu outro eu – estará e fará o mesmo por mim.

2 comentários:

  1. Esse está mais que perfeito.
    Imagens que correm na mente.
    Sensação gostosa de renovação do amor em si e por si.

    Logo penso no Caio Fernando de Abreu e o seu poema de "RE-AMAR" e logo recito pra mim... em convidando a me REAMAR ao invés de decicar a outrm.. dedicar tão somente a si...

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  2. Na íntegra:
    "Olha, eu sei que o barco tá furado e sei que você também sabe, mas queria te dizer pra não parar de remar, porque te ver remando me dá vontade de não querer parar também.Tá me entendendo? Eu sei que sim. Eu entro nesse barco, é só me pedir. Nem precisa de jeito certo, só dizer e eu vou. Faz tempo que quero ingressar nessa viagem, mas pra isso preciso saber se você vai também. Porque sozinha, não vou. Não tem como remar sozinha, eu ficaria girando em torno de mim mesma. Mas olha, eu só entro nesse barco se você prometer remar também! Eu abandono tudo, história, passado, cicatrizes. Mudo o visual, deixo o cabelo crescer, começo a comer direito, vou todo dia pra academia. Mas você tem que prometer que vai remar também, com vontade! Eu começo a ler sobre política, futebol, ficção científica. Aprendo a pescar, se precisar. Mas você tem que remar também. Eu desisto fácil, você sabe. E talvez essa viagem não dure mais do que alguns minutos, mas eu entro nesse barco, é só me pedir. Perco o medo de dirigir só pra atravessar o mundo pra te ver todo dia. Mas você tem que me prometer que vai remar junto comigo. Mesmo se esse barco estiver furado eu vou, basta me pedir. Mas a gente tem que afundar junto e descobrir que é possível nadar junto. Eu te ensino a nadar, juro! Mas você tem que me prometer que vai tentar, que vai se esforçar, que vai remar enquanto for preciso, enquanto tiver forças! Você tem que me prometer que essa viagem não vai ser a toa, que vale a pena. Que por você vale a pena. Que por nós vale a pena.
    Remar.
    Re-amar.
    Amar."
    CAIO FERNANDO DE ABREU

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