terça-feira, 26 de outubro de 2010

Os sapatos de Josué

“Eu chorava por não ter sapatos, até que um dia encontrei um homem que não tinha pés” Hards Abbott.
Essa frase estimulou um amigo a escrever um livro ao que foi dado o nome de “Os sapatos de Josué” que nunca chegara a ser publicado. Posso dizer que participei ativamente da construção, pois sempre acreditei em seu dom e nas forças que sempre o motivou.
Ele trazia consigo a dor de ser “diferente”, pois lhe faltara uma das mãos. Vou chamá-lo aqui de Poeta em substituição ao seu verdadeiro nome. O Poeta passou por várias transformações e foi vítima de várias discriminações. Mas a maior e mais cruel foi a que ele gerou contra si mesmo.
Suas idas e vindas emocionais afastava e aproximava pessoas com uma velocidade não natural. É normal e faz parte da natureza humana exigir que o outro seja como queremos. Que aja como esperamos, que fale o que queremos ouvir, que pense o que pensamos. Todavia não é normal e não deve ser normal acatarmos a estas motivações, ou seja, mudar quem somos.
Eu vi o tempo passar e vi o Poeta afastar-se de tudo o que acreditava, vi que criara um mundo único, só seu, onde ele acreditava que pudesse ser quem de fato era e que sempre recusou ser. Justamente por temer agredir aqueles que punham sobre ele expectativas que iam contra a sua própria natureza. Estava errado. Viu partir muitas pessoas, se viu perdido em meio a sua confusão existencial, chegou a questionar o amor de Deus por ele, e até mesmo o motivo de sua própria existência.
Bom, o fato é que o Poeta hoje já não escreve livros e sonetos, já não compõe mais músicas... Ele vivencia suas poesias de forma intensa e irremediável. Podemos dizer que, na frase de Hards ele, que muitas vezes achou que fazia o papel do homem que não tinha pés, na verdade ele sempre foi o que reclamou que não tinha sapatos. Pois demorou a descobrir quem realmente era e via fria e sombriamente a vida passar por seus olhos sem saber que ele tinha tudo e que na verdade a grande magia da existência está na singularidade dos seres, mesmo que nos falte uma mão, um pé, mesmo que estejamos de muletas, cegos, surdos, prostrados em uma cama...
Não importa. Somos o que somos e estarão ao nosso lado aqueles que realmente nos amam e nos aceitam. E se não nos aceitam, se os amamos de verdade, devemos deixá-los ir e dar passagens à outras pessoas. E se pararmos para pensar, este é o verdadeiro e natural ciclo das relações. Assim como a vida, as relações também se renovam, se refazem, se reconstroem.
Mas, assim como o Poeta fez, é preciso que primeiramente nós nos aceitemos. Que busquemos descobrir quem realmente somos, o que queremos, o que norteia nossa personalidade, o que impulsiona nossos desejos, mesmo que isso descontente quem está a nossa volta. Não importa. Acredite, sendo realmente quem somos, teremos sempre amigos verdadeiros.

Um comentário:

  1. ... Somos o que somos e estarão ao nosso lado aqueles que realmente nos amam e nos aceitam. E se não nos aceitam, se os amamos de verdade, devemos deixá-los ir e dar passagens à outras pessoas ...

    adorei essa parte do texto !

    A.R.

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